E espero que Brasília
seja uma cidade de homens felizes;
homens que sintam a vida
em toda a sua plenitude,
em toda a sua fragilidade;
homens que compreendam o valor
das coisas simples e puras
– um gesto, uma palavra de afeto e solidariedade.

Oscar Niemeyer

A fala em epígrafe foi publicada no Plano Orientador da Universidade de Brasília, veiculado em 1962.1 Uma das primeiras publicações da Editora da UnB, o documento é aberto com transcrição da fala do Presidente João Goulart, intitulada “A missão da Universidade de Brasília”,2 proferida em 15 de dezembro de 1961. Ao então sancionar a Lei nº. 3.998 instituindo a Fundação Universidade de Brasília, Goulart celebra a criação da UnB, como “órgão complementar indispensável para dar sentido espiritual e assegurar autonomia cultural ao conjunto de instituições que compõem a cidade-capital” e conclui indicando a esperança que a UnB constituísse

o centro cultural de Brasília, dotado da necessária criatividade para que esta cidade seja capaz de imprimir aos empreendimentos nacionais que aqui se conceberão o mesmo espírito inovador e o mesmo padrão de excelência que presidiram ao seu planejamento, fazendo da Capital da República um motivo de orgulho nacional.

A apresentação do Instituto Central de Artes (ICA) no Plano Orientador da UnB manifestava já em 1962 com o objetivo fundamental de proporcionar

a toda a comunidade universitária e à população de Brasília oportunidade de experiência e de apreciação artística. Assim, espera a Universidade tornar-se capaz de despertar vocações e incentivar a criatividade e, sobretudo, formar platéias esclarecidas, que se façam efetivamente herdeiras do patrimônio artístico da humanidade.3

Na mesma apresentação do ICA, Teatro e Cinema são reconhecidos como “campos integradores das diversas áreas”, e por isso, “objeto de particular atenção, tanto nos seus aspectos literários e técnicos, como nos artísticos.”

As Artes Cênicas na Universidade de Brasília

O prólogo acima rastreia e evidencia a presença do Teatro nos princípios e objetivos fundamentais descritos no Plano Orientador de 1962. Dois anos depois, o golpe militar em 1964 iniciou gradual e significativa obstrução contra a construção utópica e a complexa realização em curso no campus da UnB. A ditadura militar e mudanças radicais na orientação da UnB abalaram a centralidade do ICA, mas as diversas linguagens artísticas nunca deixaram de manter sua existência no Campus e suas relações com a comunidade brasiliense, bem como uma resistência em manter objetivos fundamentais da UnB.4

Em 1979, Artes Cênicas passa a ser uma das Habilitações da recém-criada Licenciatura em Educação Artística da UnB, do Departamento de Desenho, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. A Habilitação era quase que literalmente mantida por sua única professora efetiva, Helena Ribeiro Sánchez Barcellos, que promovia intercâmbios com diferentes Departamentos da UnB, além de trazer artistas renomados do teatro e dança para ministrar cursos de extensão e complementar a formação dos primeiros licenciandos em Artes Cênicas.5

Barcellos é despedida pelo Reitor Capitão de Mar e Guerra José Azeredo. É então, o Professor João Antonio de Lima Esteves que manterá a luta pela habilitação, trazendo artistas da cidade com reconhecida repercussão crítica, pedagógica e estética como Laís Aderne, B. de Paiva, Hugo Rodas, Maura Baiochi e outros, mantendo a busca de uma maior visibilidade da habilitação, que vai sendo conseguida pouco a pouco. Em 1984, o Departamento de Desenho abre o primeiro Cometa Cenas, como mostra semestral de trabalhos cênicos e performáticos da universidade e da comunidade do Distrito Federal, criado por João Antonio e alunos da opção Artes Cênicas.

A criação do Departamento de Artes Cênicas

CEN é criado em 1989. Juntamente com os Departamentos de Artes Visuais e de Música, passa a constituir o Instituto de Artes (IdA), também criado no mesmo ano. O CEN tem então dois cursos, o Bacharelado em Interpretação Teatral e a Licenciatura em Educação Artística – Artes Cênicas.

Em 1994 o Departamento, inicia o curso de Licenciatura Noturna em Educação Artística – Artes Cênicas, em trabalho chefiado por Helena Barcellos (readmitida na Anistia de 1985), com mais 15 vagas anuais. Os candidatos também selecionados na Prova de Habilidade Específica em Artes Cênicas.

Em 2002, é criada a linha de pesquisa Processos Composicionais para Cena, no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Arte (PPG-Arte) do Departamento de Artes Visuais do Instituto de Artes. A abertura dessa linha de pesquisa veio em resposta a uma crescente demanda de formação de recursos humanos decorrente da consolidação dos cursos de graduação na área de Artes Cênicas em todo o país. Também em 2002, após vinte anos com apenas a Sala Saltimbancos e uma outra saleta para aulas conceituais, obtivemos instalações próprias, com o prédio Oficinas Especiais.

Em 2007 é criada a Licenciatura em Teatro a distância, curso semi-presencial inserido no Sistema UAB- Universidade Aberta do Brasil.

Em 2014, a partir da experiência acumulada de mais de uma década de atuação junto ao PPG-Arte, foi aberto o Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas (PPG-CEN), constituído por um curso de Mestrado e que se estrutura em duas linhas de pesquisa: Processos composicionais para a cena e Cultura e Saberes em Artes Cênicas.

O CEN é composto atualmente por vinte e oito professores no quadro efetivo, nove funcionários no corpo técnico-administrativo e diferentes programas de bolsas e monitorias que integram ensino e administração. Temos maior visibilidade nacional e vamos expandindo progressivamente nossas atividades internacionais.

 

1 Artur Neves (ed.), Plano Orientador da Universidade de Brasília, Brasília: Editora da UnB, 1962. Não há numeração das páginas na publicação.

2 O Plano Orientador de 1962 é assinado por uma seleção especial de grandes brasileiros que incluem, entre outros membros efetivos do Conselho Diretor da Fundação, Darcy Ribeiro, Anísio Teixeira, Frei Mateus Rocha, além dos Coordenadores de cursos que incluíam artistas como Cyro dos Anjos e Alcides da Rocha Miranda, coordenadores respectivamente dos Institutos de Letras e de Artes. Os sete Institutos seriam responsáveis por cumprir sete funções básicas da UnB, sintetizadas no Plano, onde podemos destacar a função de “garantir à nova Capital a capacidade de interagir com os nossos principais centros culturais, para ensejar o pleno desenvolvimento das ciências, das letras e das artes em todo o Brasil”.

3 idem

4 Em 1963, os Departamentos de História e Teoria da Arte, de Representação e Expressão e de Tecnologia da Construção do ICA e do Instituto de Arquitetura são renomeados como Artes e Artesanato, e Arquitetura.  Em 1964 separam-se o Instituto Central de Artes e a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Em 1970 é criado o Instituto de Artes e Arquitetura, com Departamentos de Arquitetura, Artes Visuais, Cinema e Música, dividido novamente em 1976 em Departamentos de Arte (curso de Música) do Instituto de Comunicação e Expressão, e o Departamento de Desenho, do Instituto de Arquitetura. O Departamento de Desenho cria em 1979 a Licenciatura em Educação Artística da UnB, com habilitações em Artes Cênicas, Artes Plásticas, Desenho e Música.

5 Artistas e professores como B. de Paiva, Dina Sfat, Jesus Vivas, João Antonio Lima Esteves, Lúcia Sander, Luis Mendonça, Luiz Carlos Ripper, Maria Carmem, Maria Ruth, Paulo César Péreio, entre outros.